As sessões a partir daí passaram a decorrer como mandavam os procedimentos. Da minha parte não me lembrei mais de trazer um livro para colocar na estante, nem ela voltou a tocar no assunto. Livros era a última coisa que me ocupava a mente. Durante as primeiras sessões era nos seus pés que pensava. Vestidos de preto sobre a alcatifa. Andava às voltas com esta imagem na minha cabeça. Devia ter dito que estava aborrecido com aquela estante e que já não a podia ver à frente. Só para ter a oportunidade de lhe ver os pés novamente. Nunca referi este pequeno elefante que se pavoneava entre nós. Cheguei inclusive a sonhar várias vezes com a primeira sessão. Ela tirava os sapatos, que curiosamente no sonho eram sempre de modelos diferentes, e ficava defronte a mim. Descalça com as meias pretas sobre a alcatifa cinzenta. Sem dizer nada. O espaço onde decorria o sonho nem sempre era o consultório. Por vezes era no exterior. Como por exemplo uma rua de cidade. E nem sempre éramos só nós. O certo é que o sonho acabava comigo com uma ereção na realidade. Uma ereção bastante incómoda. Nada de tesão pela metade. Quando acordava lá estava ele, o meu pénis a querer rebentar-me os boxers. Rijo como pedra. Mas não sentia necessidade de me aliviar de algum modo. Não estava possuído por qualquer tipo de desejo irresistível. Apenas estranheza.
“E ires às putas?”
“Obrigado, Nuno.”
“Falo a sério.”
Não sabia porque é que continuava a esperar alguma compreensão da parte de um homem como o Nuno. Mas era a ele que me dirigia quando queria falar de intimidades.
“É o que costumo fazer. Se quiseres até te digo onde vou.”
Claro que eu não referi o sonho com a psicóloga. Não queria envolver outra pessoa numa questão que até ver era só minha.
"Então e outras mulheres? Amigas, ex-namoradas, não conheces alguém que te possa ajudar?"
“Não é desejo sexual.”
Nunca me lembraria de pedir conselhos desta natureza a alguém que só gostava de mulheres que gostassem de levar umas boas palmadas no rabo. No entanto, no início da nossa amizade, cheguei a dar-lhe o benefício da dúvida.
“Conheceste alguma mulher que te tenha marcado? Alguém que possas dizer com alguma certeza que amaste,” perguntei-lhe depois de perceber que ele também era um homem solitário. Portanto uma pessoa que em princípio teria uma experiência amorosa semelhante à minha.
“Sim, a minha mãe.”
"Ok."
A conversa terminou logo ali. E ficara explicada, a meu ver, a sua preferência por casas de alterne. Amor com amor se paga.
“Apenas falo disto porque se trata de uma ereção execionalmente firme. E recorrente. Não vou dizer que é dolorosa mas.”
“Sabias que o Hitler tinha ereções enquanto discursava?”
Desconhecia por completo que haviam registos de tal patologia nesse homem. Mas pelos vistos existiam e o meu chefe estava a par deles. Podiam até ser falsos mas eu não tinha vontade nenhuma de procurar a verdade.